Mesmo em um país agraciado por diversos aspectos favoráveis ao agronegócio, estamos preparados para entender e gerenciar os riscos deste massivo mercado em um ambiente internacional significativamente complexo?

O agronegócio brasileiro é um dos setores mais relevantes da economia do país. De acordo com dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), o agronegócio representa cerca de 23,5% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, além de ser responsável por cerca de 44% das exportações do país, contribuindo significativamente para a balança comercial.

O Brasil é reconhecidamente um dos principais produtores de commodities agrícolas, como soja, milho, café, açúcar, carne bovina, entre outros. De acordo com dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o Brasil é o maior exportador mundial de carne bovina, açúcar, suco de laranja e café. Além disso, é o segundo maior produtor de soja, milho e carne de frango. Essa posição de destaque no mercado internacional contribui para a influência do agronegócio brasileiro no cenário global.

Segundo relatório da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o país é responsável por aproximadamente 7,5% das exportações agrícolas do mundo. Essa participação expressiva demonstra a relevância do agronegócio brasileiro como fornecedor de alimentos e produtos para diversos países.

Os riscos do setor agropecuário

É fato que o Brasil é um país agraciado por diversos aspectos favoráveis ao desenvolvimento do agronegócio, como um clima propício para a produção agrícola, vastas áreas de terras cultiváveis e uma forte base de conhecimento agrícola. 

Esses fatores impulsionam a produtividade e a competitividade do setor no cenário internacional. Mas estamos preparados para entender e gerenciar os riscos deste massivo mercado em um ambiente internacional significativamente complexo? Afinal quais são os principais riscos que preocupam a mente frutífera do produtor?

Os principais riscos do setor agropecuário estão nas seguintes categorias:

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Operacionais

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Agronômicos

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Institucionais

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Ambientais

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Financeiros (mercado, crédito e liquidez)

Os riscos operacionais estão ligados ao processo produtivo e à gestão da empresa, como falhas no plantio, acidentes de trabalho e problemas no maquinário. 

Já os riscos agronômicos são mais difíceis de prever e controlar seus efeitos, pois são eventos físicos e biológicos que podem impactar o cultivo e a produtividade das lavouras, como secas extremas, granizos nas plantações ou ataque de uma praga. Os riscos ambientais referem-se às metas e ações estipuladas em acordos nacionais e internacionais, como a produção em áreas de desmatamento, diminuição de emissão de carbono e restrições em defensivos agrícolas. Os riscos institucionais estão relacionados às legislações, políticas fiscais e tarifárias, normas sanitárias e ações internas da organização produtora.

Os riscos financeiros estão associados aos impactos nos fluxos financeiros, tal como falta de dinheiro para honrar seus compromissos (liquidez), dificuldade em obter empréstimos (crédito) e oscilações nos preços dos ativos e taxas de câmbio (mercado)

Os riscos do mercado estão associados à flutuação dos preços, que variam conforme oferta e demanda de commodities e outras variáveis, como custos e receita que também podem ser alterados com mudanças nas taxas de juros, taxas de câmbio e confiança do mercado no país.

Mitigando riscos em meio a um panorama de complexidades

Notadamente, nossa base de conhecimento no campo, na operação e na cultura, são vastamente explorados e bem dominados nas férteis terras brasileiras. Contudo, a crescente complexidade dos mercados internacionais e o foco dos mercados financeiros no ambiente agropecuário tem trazido maior complexidade para o planejamento estratégico da safra/produção e, por consequência, nas oportunidades de negócio.

Antes mesmo da primeira semente tocar o chão ou do primeiro mugir do bezerro, as incertezas internacionais esticam e puxam para todos os lados a disponibilidade e preços dos insumos e produtos do agronegócio.

Mas como podemos nos preparar para proteger nosso patrimônio, nossa produção, nossa terra e nosso produto destes riscos financeiros? Que instrumentos podemos aplicar no planejamento de fecundar a terra, e proteger os preços de venda dos nossos frutos?

O mercado financeiro conta com um amplo leque de instrumentos para mitigar os riscos de mercado. Entre eles, destacam-se:

Contratos a termo, compra ou venda futura, non-delivery forwards (NDFs)

Permitem fixar um preço de venda ou compra antecipadamente, protegendo a margem de lucro contra possíveis oscilações de preços no futuro. Os contratos futuros podem ser, ainda, com liquidação física, ou seja, com a entrega do produto da safra ao comprador, dentro de uma séria de critérios definidos em contrato. Neste caso, um produtor de café que precisa garantir o preço de venda de sua safra, pode efetuar a venda a termo (em data futura).

No vencimento estabelecido em contrato, oscilações negativas no preço do café serão compensadas pelo preço de venda prefixado no contrato a termo. Importante ressaltar que o objetivo destes instrumentos não é a obtenção de lucro, mas sim a proteção. Existem instrumentos com liquidação física, ou seja, no vencimento o produtor deverá realizar a entrega da mercadoria, e também há os contratos a termo com liquidação financeira.

Contratos de Opções

São instrumentos que garantem o direito de compra (opção de compra) ou venda (opção de venda) de um ativo a um preço pré-determinado em uma data futura. Seu funcionamento se assemelha a uma apólice de seguro. Imagine o produtor rural que tomou um empréstimo em dólar, no valor de USD 200 mil, para pagar ao final de um ano.

No momento da obtenção de crédito, a cotação do dólar era de R$ 5,00, então o fluxo de caixa pela obtenção do empréstimo foi de R$ 1 milhão. No vencimento, o produtor deverá liquidar os USD 200 com a contraparte, de forma que a depreciação do Real causa prejuízo. Uma alternativa será a obtenção de uma opção de compra (Call) com o valor de exercício igual a R$ 5,00.

No vencimento, caso o real tenha sido apreciado e a cotação esteja abaixo de R$ 5,00, a liquidação do empréstimo será feita a um valor abaixo de R$ 1 milhão (desconsiderando o efeito dos juros) e a opção não será exercida. Caso o real tenha sido depreciado e a cotação esteja a R$ 5,10, por exemplo, o produtor liquidará sua dívida com prejuízo, mas exercerá o seu direito de comprar moeda a R$ 5,00, compensando o prejuízo na liquidação do empréstimo.

Contratos de SWAP

Representa um acordo entre duas partes para que troquem entre si fluxos de caixa baseados em um valor de referência, um prazo e outras condições e critérios preestabelecidos. Um contrato de swap valoriza ou não segundo essas regras e parâmetros. Os swaps também costumam ser definidos como uma troca de “riscos”, em que os participantes negociam as rentabilidades de dois ativos ou mercadorias diferentes.

Eles são bastante usados em estratégias de proteção – ou hedge. Seguindo o exemplo citado anteriormente, o produtor rural, em vez de adquirir uma call, poderia realizar um Swap, onde trocaria o passivo de sua dívida, de dólar para real. A contratação do Swap seria uma ponta ativa em dólar, compensada pelo passivo em dólar, e uma ponta ativa em reais.  

Seguro rural

Oferece proteção contra eventos climáticos, tais como seca, enchentes, granizo, entre outros, que podem prejudicar a produtividade das lavouras e afetar a rentabilidade do negócio.

Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRAs)

Os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) são títulos de renda fixa lastreados em recebíveis originados de negócios entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros, abrangendo financiamentos ou empréstimos relacionados à produção, à comercialização, ao beneficiamento ou à industrialização de produtos, insumos agropecuários ou máquinas e implementos utilizados na produção agropecuária.

Nessas operações, as empresas cedem seus recebíveis para uma securitizadora, que emitirá os títulos e os disponibilizará para negociação no mercado de capitais, geralmente com o auxílio de uma instituição financeira. Por fim, essa securitizadora irá pagar à organização produtora pelos recebíveis cedidos, que desse modo consegue antecipar o recebimento de seus recebíveis como fonte de financiamento.

Como contratar os instrumentos corretos?

Existem dois mercados onde esses instrumentos são negociados. O mercado de bolsa, onde os instrumentos são negociados de forma padronizada, com volume, valor e vencimento específicos (prateleira). Há uma infinidade de ativos que se pode negociar, como moedas, taxas de juros, commodities. No mercado brasileiro, esses instrumentos são negociados na B3.

O mercado de balcão diverge com relação ao tipo de negociação. Uma vez que a B3 não atua como contraparte central, existe o risco aumentado, sob a ótica da instituição financeira, o que pode implicar maiores custos.

É importante realizar uma análise cuidadosa das condições e custos envolvidos em cada instrumento financeiro, como mecanismos de ajuste diário e chamadas de margem, nos contratos de bolsa, bem como spreads e outros mecanismos de compensação do risco de crédito em instrumentos de balcão. Ainda, nos instrumentos de balcão, é preciso atentar à metodologia de cálculo do valor justo da operação.

O impacto nas finanças

Estes instrumentos visam mitigar os riscos financeiros do agronegócio sempre com um propósito claro na sua liquidação, ou seja, visando o horizonte de tempo da produção, buscando a proteção da geração de caixa no final de sua vigência. 

Durante o seu periodo de vigência, é vital conhecer e entender os controles necessários para a gestão do contrato, que vão municiar o tomador de decisões sobre as oportunidades de mantenimento ou liquidação antecipada.

Inclusive, alguns destes contratos demandam especial atenção para atendimentos regulatórios e fiscais específicos, bem como uma adequada formalização das políticas contábeis e operacionais no âmbito de aplicação dos instrumentos financeiros de proteção, bem como o desenho destas políticas e controles para proteger adequadamente os riscos para quais foram contratados inicialmente, considerando que alguns destes foram firmados para proteger variações que já existem no balanço das organizações produtoras e que geram imediatamente efeitos de sua variação no resultado antes mesmo do produto agrícola estar disponível para comercialização, como os instrumentos mencionados anteriormente.

Portanto, esta avaliação e a designação dos instrumentos para proteção das variações no resultado, bem como a avaliação de eficácia da proteção, são vitais para proteger o resultado ou o patrimônio das organizações produtoras, exatamente como desejado, e também não atrair riscos de especulação aos resultados, assim também, possíveis impactos tributários indesejados.

Um exemplo, contratos a termo são usados para fixar o preço futuro de grãos, em casos que os recebíveis pela venda já estejam no balanço (saldos de recebíveis por vendas entregues) as variações deste contrato protegem a variação do recebível no resultado, já nos caso de contratos de venda se safras futuras (em que os recebíveis não estão no balanço) as variações no valor desses contratos podem afetar o patrimônio líquido por meio de outros resultados abrangentes, visando proteger a variação futura da venda.

Homem asiático observando plantação de alface

Implementando a Proteção Financeira no Agronegócio: O que Observar

  • Implementando a Proteção Financeira no Agronegócio: O que Observar

    Conheça bem os riscos do seu agronegócio: 

    Cada segmento do Agronegócio possui particularidades e riscos específicos. É importante conhecer bem esses riscos para realizar uma adequada gestão financeira.

  • Implementando a Proteção Financeira no Agronegócio: O que Observar

    Tenha um plano de gerenciamento de riscos:  

    Defina estratégias para lidar com os riscos identificados, considerando os instrumentos financeiros disponíveis.

  • Implementando a Proteção Financeira no Agronegócio: O que Observar

    Esteja atualizado sobre o mercado: 

    Acompanhe as tendências do mercado agrícola, análise os fatores macroeconômicos e políticos que possam afetar o setor. Isso auxiliará na tomada de decisões mais assertivas.

  • Implementando a Proteção Financeira no Agronegócio: O que Observar

    Esteja preparado para situações adversas:  

    Mesmo com a utilização de instrumentos financeiros de proteção, imprevistos podem acontecer. Mantenha uma reserva de emergência para minimizar impactos financeiros negativos caso ocorram.

  • Implementando a Proteção Financeira no Agronegócio: O que Observar

    Para a contabilidade:

    O instrumento derivativo deverá ser considerado como valor justo no resultado, enquanto o passivo que este protege, será contabilizado como provisão, e não terá efeito direto no resultado.

  • Implementando a Proteção Financeira no Agronegócio: O que Observar

    Para mitigar os efeitos das oscilações de mercado no resultado:

    É possível implementar uma estrutura de contabilidade de hedge, onde os termos críticos do passivo e do derivativo são demonstrados como efetivos, seguindo as regras do CPC48 (IFRS9). Desta forma, as oscilações da estrutura de hedge podem ser contabilizadas sem impactos indesejados no resultado da Companhia.

Conclusão

Proteger o agronegócio dos riscos financeiros é essencial para garantir a sustentabilidade e o sucesso do negócio. 

Por meio da utilização dos instrumentos financeiros adequados, é possível minimizar os riscos e aumentar a rentabilidade das operações. No entanto, é necessário analisar cada instrumento com cautela, contratar profissionais especializados e estar atento às condições de mercado. Com uma gestão financeira eficiente e a implantação correta desses instrumentos, é possível reduzir os riscos e assegurar a saúde financeira do agronegócio no Brasil.

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