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A orientação da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) lançou alguma luz sobre o caminho a seguir, embora muito ainda permaneça aberto à interpretação e potencial disputa. Com base nas contribuições de especialistas da OCDE e da Grant Thornton, compartilhamos as principais dicas para superar os desafios existentes.
Em abril de 2021, cerca de 200 líderes de empresas e autoridades fiscais em todo o mundo se reuniram com especialistas da OCDE e da Grant Thornton para explorar as questões de preços de transferência levantadas pela pandemia. O nível de interesse de países tão distantes quanto Argentina e Nova Zelândia atesta as profundas incertezas sobre os preços de transferência e as preocupações resultantes sobre o potencial de dupla tributação e disputas.
Nesse processo, agradecemos a Sabine Wahl e Norman Wingen, consultores de preços de transferência da OCDE, por seus insights durante suas apresentações e respostas às perguntas.
Entendendo o cenário de preços de transferência
Então, qual é o pano de fundo para todos os desafios e por que são relevantes? Muitas empresas sofreram perdas severas no ano passado, embora outras tenham visto um aumento nos lucros. Mesmo dentro dos setores, há variações marcantes. O fechamento das fronteiras e a suspensão de algumas operações interromperam ainda mais o serviço e o fornecimento intragrupo.
E esses tempos excepcionais estão longe de acabar. As incertezas que se avizinham não decorrem apenas de novas ondas de infecção, mas também do aumento da demanda por propriedade intelectual e serviços intragrupo conforme as empresas reabastecem, aumentam as operações de marketing ou transferem mais seus negócios para o ambiente digital.
Políticas confiáveis e justificativas claras são sempre importantes nos preços de transferência. As abordagens podem divergir consideravelmente do passado, mas, por sua vez, as próprias autoridades fiscais estão sob pressão para maximizar a sua arrecadação fiscal, o que pode aumentar o risco de contestação, auditoria e disputa.
“Os déficits fiscais em muitos países significam que as autoridades fiscais estarão ansiosas para maximizar a arrecadação de impostos e relutantes em compartilhá-la com outras jurisdições. Como resultado, a análise dos preços de transferência, o potencial para dupla tributação e disputas aumentaram. Isso torna ainda mais importante garantir que as abordagens de preços de transferência sejam bem definidas”, afirma Christophe Ludwig, sócio da Grant Thornton Alemanha.
Orientação da OCDE é limitada a certo ponto
Publicado em dezembro de 2020, o Guia da OCDE sobre as implicações da pandemia nos preços de transferência apresenta recomendações práticas sobre como enfrentar alguns desses desafios. As áreas cobertas incluem análise de comparabilidade; perdas e a alocação de custos específicos da pandemia; programas de assistência governamental; e acordos de preços antecipados (APAs, da sigla em inglês).
O esclarecimento de como o princípio de arm´s length se aplicaria nas circunstâncias atuais representa um consenso duramente conquistado entre mais de uma centena de jurisdições de "framework inclusivo". No entanto, trata-se de uma orientação e não de diretrizes, o que deixa muitas áreas nebulosas para empresas e autoridades fiscais. Por sua vez, a necessidade de chegar a um acordo dentro de prazos razoáveis significa que algumas das áreas mais contenciosas, como intangíveis, foram omitidas das orientações.
“Embora as recomendações da OCDE sejam um bom ponto de partida para determinar os preços de transferência nas circunstâncias atuais, elas oferecem orientação em vez de diretrizes efetivas. As empresas ainda precisarão apresentar justificativas claras e documentação de apoio para garantir a aprovação das autoridades fiscais durante esses tempos excepcionais”, diz Pascal Luquet, sócio e head de preços de transferência da Grant Thornton França.
Então, quais são as principais considerações para o seu negócio? As principais questões de preços de transferência que precisam ser tratadas se enquadram em cinco categorias amplas, embora haja uma sobreposição considerável e impactos indiretos entre elas.
Confira também → Global Transfer Pricing Guide | Grant Thornton
Primeira categoria – Compartilhando perdas excepcionais ou superlucros
Como as receitas despencaram ou aumentaram, as questões-chave de uma perspectiva de preços de transferência incluem qual entidade arca com essas perdas ou ganhos excepcionais?
Também houve mudanças significativas, à medida que as receitas de muitas empresas se recuperaram em meados de 2020, logo apresentaram queda após os bloqueios e lockdowns serem anunciados novamente. A questão aqui é se devemos tratar esses períodos de perda excepcional isoladamente ou suavizar as avaliações financeiras para criar uma visão do ano inteiro.
Implicações e complicações
Não basta dizer que “tempos excepcionais exigem medidas excepcionais”. O princípio de arm’s length e as regras de preços de transferência devem se aplicar tanto em tempos bons quanto ruins. A exposição a riscos é central para a alocação de receita. Se uma operação, como um centro de distribuição, é designada como de baixo risco e a receita reflete isso em tempos normais, é difícil justificar grandes perdas devido a uma pandemia. A maioria das perdas deve ser incorrida em outro lugar ou a operação precisa ser redesignada.
Da mesma forma, as comparações de todo o setor não são suficientes por si mesmas para justificar qualquer mudança nos riscos incorridos ou nas perdas alocadas. Dada a variedade e localização dos impactos, sua empresa precisaria definir como os riscos se manifestaram e como você respondeu a cada entidade e ao grupo como um todo.
Ações
Construa uma imagem clara e demonstrável de como a economia e os riscos de cada entidade foram afetados. As justificativas devem ser construídas em torno da análise dos resultados gerados ou comparações relevantes com terceiros.
Garanta que os ganhos e perdas estejam alinhados com sua estrutura de controle de risco. Caso contrário, é importante justificar isso e avaliar o impacto sobre os preços de transferência passados e futuros se as designações de risco mudarem.
Dados os níveis atuais de incerteza e volatilidade, pode ser necessário trabalhar com ciclos de planejamento mais curtos. Isso inclui considerar o colapso temporário na receita durante o bloqueio e uma recuperação posterior, separadamente.
Em certas circunstâncias, pode ser possível aplicar cláusulas de força maior (liberando as partes de obrigações) e uma possível modificação dos acordos existentes. Mas como os efeitos da pandemia variam de acordo com a indústria, modelo de negócios ou mercado, essa pergunta só pode ser respondida por meio de uma análise cuidadosa dos custos específicos em consideração.
Segunda categoria – Análise de comparabilidade
Precedentes do passado geralmente podem fornecer uma base útil para a aplicação do princípio de arm’s length. Mas 2020 e 2021 não poderiam ser mais diferentes de 2018 e 2019.
Existem precedentes no passado mais distante em que podemos recorrer? Infelizmente, isso não é fácil. Na visão dos representantes da OCDE, a situação atual é tão excepcional que nenhuma crise anterior, incluindo a crise financeira global, oferece qualquer guia geral para lidar com o deslocamento e seu impacto sobre os preços de transferência.
Implicações e complicações
Dados os níveis de turbulência e falta de confiabilidade das suposições anteriores, pode ser necessário implantar novas abordagens para compensar gaps ou deficiências. A OCDE reconhece isso em suas orientações.
Ações
É importante identificar as abordagens mais adequadas para suas circunstâncias específicas. As abordagens citadas pelos representantes da OCDE durante o webinar incluem testes de resultados e/ou o uso de informações financeiras orçadas. Em nossa experiência, isso tende a funcionar melhor quando as previsões orçadas em áreas como vendas e custos são comparadas aos resultados reais.
Certas informações publicamente disponíveis também podem ajudar a estimar e validar o impacto da pandemia. As fontes potenciais incluem demonstrações financeiras intermediárias, mudanças na utilização da capacidade ou intervenções do governo que afetam os preços.
“Bases comparáveis são extremamente importantes para o atual momento, pois auxilia as empresas a enxergarem as direções que precisam seguir ou até mesmo rediscutir preços de operações já celebrados com empresas ligadas e com terceiros”, ressalta Daniel Souza, sócio de Tributos Diretos e Preço de Transferência da Grant Thornton Brasil
Terceira categoria – Assistência governamental
Muitas empresas dependem de subsídios, empréstimos, incentivos fiscais e outros apoios do Estado. Os governos naturalmente desejam que essa ajuda beneficie os cidadãos e as empresas de seus países, em vez de ir para o exterior. Isso cria dilemas jurídicos e de reputação, bem como de preços de transferência técnicos.
A OCDE ofereceu algumas orientações limitadas sobre os programas de assistência governamental. Mas não discute os efeitos de outras intervenções governamentais, incluindo medidas como controles de fronteira que impedem o cumprimento dos acordos intragrupo existentes.
Implicações e complicações
A assistência governamental é geralmente considerada um fator economicamente relevante e, portanto, deve ser considerada ao fazer e justificar alterações nos preços de transferência. A assistência governamental também deve ser considerada ao realizar análises de comparabilidade.
A alocação de benefícios entre as partes relacionadas pode ser objeto de contestação e disputa. Por exemplo, muitas operações consideradas de baixo risco de uma perspectiva de preços de transferência, como armazenamento, também são relativamente intensivas em mão de obra e, portanto, provavelmente se beneficiaram de subsídios salariais.
Ações
Diante da análise do governo, é importante garantir que os preços de transferência e outras decisões fiscais, cálculos e pagamentos estejam alinhados.
Considere até que ponto o recebimento de assistência governamental é economicamente relevante. Como parte desta análise, é importante avaliar se quaisquer outras características do mercado local são relevantes.
Considere como a assistência governamental pode modificar a alocação de risco em uma transação controlada.
Quarta categoria - Tratamento de intangíveis
Os intangíveis sempre foram uma área em que as opiniões das autoridades fiscais diferem. As longas deliberações sobre o tratamento de intangíveis de difícil valor (HTVI, da sigla em inglês) no BEPS podem atestar. Isso ajuda a explicar por que a OCDE não foi capaz de garantir um consenso dentro de sua orientação de preços de transferência dentro do tempo permitido.
Embora não haja nenhuma nova orientação da OCDE sobre este tópico, houve importantes desenvolvimentos locais em diversas jurisdições, incluindo o aumento dos requisitos de relatórios e uma ampliação da definição de HTVI.
Os desafios são agravados por mudanças não relacionadas à Covid-19. Isso inclui mudanças na legislação tributária (por exemplo, demandas de onshoring) e a necessidade de um alinhamento mais estreito entre a propriedade legal e a substância econômica.
Implicações e complicações
A ausência de orientações atualizadas da OCDE sobre intangíveis significa que a interpretação é mais aberta para autoridades fiscais individuais, diferenças potenciais entre elas e o risco resultante de dupla tributação e disputas.
Ações
Identifique o que aconteceu no negócio ou em seus mercados para impulsionar quaisquer mudanças nos preços de transferência. Teste regularmente as suposições em relação aos resultados. “Os riscos do desafio em torno da transferência de propriedade intelectual e outros intangíveis são maiores do que nunca. Esta sempre foi uma área em que as interpretações variam. Agora, estamos vendo o impacto da pandemia e de regras mais rígidas sobre offshoring e substância econômica. Na ausência de orientação da OCDE, é importante garantir que as regras de substância econômica sejam aplicadas de forma robusta e que os motivadores para quaisquer mudanças sejam claramente explicados”, pontuou Charles Marais, sócio da Grant Thornton Holanda.
Quinta categoria – acordos de preços antecipados
A pandemia mudou as condições econômicas de maneiras que podem não ter sido previstas quando muitos APAs foram negociados. Portanto, é importante determinar como esses desenvolvimentos podem afetar a aplicação dos APAs existentes ou exigir sua alteração.
Implicações e complicações
Mudanças nas circunstâncias econômicas podem não necessariamente fornecer motivos para alterar ou desconsiderar o acordo, a menos que constituam uma mudança material nas premissas críticas que sustentam o APA. Portanto, é importante consultar a autoridade fiscal.
A abertura para a revisão do APA varia de acordo com a autoridade tributária.
Ações
Respeite os termos do APA, a menos que ocorra um motivo legítimo para o cancelamento, como uma violação clara das premissas críticas. Essas suposições devem ser explicitadas no APA.
Se as condições econômicas mudaram, é importante se envolver de forma proativa com as autoridades fiscais e trabalhar com elas de forma colaborativa e transparente para levantar questões relevantes e acordar modificações. Não seria sensato agir unilateralmente sem consultar as autoridades fiscais relevantes.
Documente e lide com quaisquer violações de suposições críticas ou motivos pelos quais os termos do APA possam precisar ser alterados.
“Mudanças nas condições econômicas ou suposições críticas podem invalidar os termos de alguns APAs. É importante que as empresas e as autoridades fiscais sejam proativas, flexíveis e com a mente aberta sobre como resolver esses problemas. Esta abordagem colaborativa pode ajudar a aliviar o risco fiscal e evitar auditorias e disputas desnecessárias”, afirma Paolo Besio, sócio da Grant Thornton Itália.
Posicione-se estrategicamente
Navegar pelas regras de preços de transferência nunca foi fácil. O impacto econômico da Covid-19 acrescentou uma nova camada de complexidade e aumentou o risco de desafio. É por isso que é tão importante garantir que as políticas sejam justificadas e que haja documentação para apoiar isso. Outras prioridades incluem o envolvimento com as autoridades fiscais, entendendo como estão aplicando as regras nas condições atuais e avaliando o que esperam. Cinco áreas principais de desafio potencial que precisam ser abordadas se destacam:
- Compartilhamento de perdas excepcionais (ou superlucros) e pagamentos de apoio governamental
- Análises de comparabilidade e teste de resultados
- Lidando com intangíveis
- Consideração de suposições críticas da APA
- Preparação para disputas (documentação contemporânea).
“A pandemia não mudou as regras sobre preços de transferência, apenas os tornou mais difíceis de aplicar e mais abertos a desafios. A melhor maneira de evitar disputas ou lidar com elas de forma eficaz é estar pronto. Isso significa garantir que você tenha a análise e a documentação para fazer o backup do que está fazendo e por quê. O grande perigo é ir para as autoridades fiscais de mãos vazias”, ressaltou Wendy Nicholls, sócia da Grant Thornton Reino Unido.
Como podemos auxiliar a sua empresa em preços de transferência?
Se você quiser discutir qualquer uma das questões levantadas neste documento ou quiser saber mais sobre o impacto da pandemia em seus preços de transferência e acordos tributários mais amplos, sinta-se à vontade para entrar em contato com os nossos especialistas locais e globais.
Descubra nossas abordagens em Preço de Transferência